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Notas Prévias sobre a datação do Sítio RS-167 A/7 em Santa Vitória do Palmar, RS

Cerrito é o nome dado à um tipo de sítio arqueológico cuja estrutura de aterro corresponde a uma determinada ocupação humana, com limites geográficos estabelecidos entre todo o território Uruguaio, porções do território argentino e no extremo sul do Brasil. Existem ainda indicações e pesquisas sobre aterros construídos em diferentes locais do Brasil, como na região pantaneira e no norte do país, porém a denominação Cerrito é exclusivamente utilizada para aqueles localizados no sul da américa latina (RIBEIRO, 2016; GARCIA, 2010; MILHEIRA, et al., 2016).
Pensando em uma ocupação microrregional voltada ao uso e ocupação da paisagem, estes sítios arqueológicos comumente são encontrados em áreas alagáveis e descampadas, o que confere ao local uma boa vista da paisagem ao seu entorno. Sua estrutura morfológica é comumente descrita como simples podendo conter apenas um aterro ou conjuntos de aterros de morfologias circulares e/ou elipsoidais. Existem indícios de conjuntos de cerritos que podem conter dezenas de aterros (RIBEIRO, 2016; GARCIA, 2010; PEÇANHA, 2014).
Olhando através de uma longa e contínua ocupação do espaço, a interpretação mais usual associa os construtores de cerritos no Brasil e Uruguai aos indígenas Charruas e Minuanos, enquanto que para as terras argentinas estão relacionados aos Chaná-timbú. A historiografia reconhece todos estes grupos através de relatos de viajantes naturalistas que percorreram estas terras no século XVI (MILHEIRA et al., 2016).
De acordo com Lopez Mazz & Bracoo (apud MILHEIRA et al., 2016), no entanto, a direta associação entre os cerritos e estes grupos vivendo em correlação é complicada, haja visto que do ponto de vista historiográfico “é sempre perigoso extrapolar categorias étnicas históricas coloniais a um passado pré-colonial de longa duração e realizar analogias com uma sociedade com aproximadamente 5 mil anos de história” (MILHEIRA et al., 2016, p. 34). Outro ponto a ser considerado é que, ao menos para a ocupação das regiões das bacias da Laguna dos Patos e da Lagoa Mirim, a ocupação humana pode ter ocorrido apenas associada à grupos Minuano, de tradicional inimizade com os Charrua (MILHEIRA et al., 2016).
Estes sítios arqueológicos possuem uma cultura material mista, na qual é possível identificar artefatos líticos, cerâmicas, restos alimentares (mamíferos, aves e peixes por exemplo), fogueiras e também enterramentos, apresentando funções associadas à descarte de materiais, demarcadores territoriais e de paisagem, habitação em áreas alagadas e alagadiças “ou mesmo monumentos que remontam à memória histórica e à identidade social contemporânea dos índios pampeanos” (MILHEIRA et al., 2016, p. 34).
As ocupações mais antigas de grupos construtores de Cerritos estão localizadas no Uruguai, seguidas do Brasil e por fim o local que apresenta as datações mais recentes é a Argentina. Características como altura e diâmetro são mais homogêneas, porém ainda os sítios arqueológicos deste tipo no Uruguai apresentam dimensões maiores.
Dos sítios que sofreram com intervenções em Santa Vitória do Palmar iremos tratar de maneira mais específica do Cerrito RS 167 A/7, o qual está associado diretamente a outros 6 Cerritos, sendo estes: RS 167 A/6; RS 167 A/5; RS 167 A/4; RS 167 A/3; RS 167 A/2 e RS 167 A/1. Os montículos desse complexo estão localizados a aproximadamente 2,5 km da margem esquerda do arroio Chuí, estando todos associados diretamente uns aos outros instalados em uma linearidade de sentido noroeste/sudeste. O único sítio que está ‘separado’ dos demais é o RS 167 A/1, e isso deve-se ao fato de uma estrada de acesso ter sido construída entre ele e os demais sítios (DA ROSA, 2019). A paisagem ao redor é típica de campos limpos de relevo ondulado, estrutura semelhante à outras regiões costeiras do Rio Grande do Sul. O sítio é circundado por plantações de arroz, atividade esta que já impactou parte desse contexto arqueológico. Outro detalhe de grande importância é distância do sítio com o litoral da Costa Atlântica, estando a apenas 10 km da faixa de areia do mar – em sentido sudeste.
O acervo cultural desse complexo de cerritos é composto por remanescentes líticos, cerâmicos, materiais ósseos de vestígios de alimentação predominantemente de mamíferos, não contendo remanescentes de animais lacustres, característica marcante nos cerritos escavados em Pelotas e Capão do Leão (MILHEIRA et al., 2016; GARCIA, 2019; LOUREIRO, 2008). Destaca-se ainda a presença de uma concentração de ossos humanos no sítio RS 167/8, que indica que este sítio poderia ser utilizado como área de sepultamento dentro do complexo de ocupação.
Outra característica a ser ressaltada sobre o sítio é que a estrutura do mesmo, suas feições de diâmetro e altura, assemelham-se mais aos cerritos identificados no Uruguai do que aqueles identificados na região de Pelotas e Capão do Leal, ou seja, são maiores e seus aterros ocupam áreas mais amplas quando comparados com outros. Os sítios de Pelotas e região são mais homogêneos à natureza, não sendo facilmente reconhecidos por não apresentarem grandes alturas e diâmetro como aqueles presentes no Uruguai e em Santa Vitória (DA ROSA, 2019; MILHEIRA et al., 2016; LOUREIRO, 2008; MILHEIRA & GIANOTTI, 2018).
Destacamos aqui a importância do Cerrito 167 A/7, pois além de fazer parte de um conjunto de sítios relevante para os estudos regionais, este é o único do município de Santa Vitória do Palmar que possui datação, a qual fornece parâmetros para discutir o processo de ocupação entre o litoral brasileiro e o interior do Uruguai. Enquanto as datações no Uruguai variam entre 190 ± 40 AP (não calibrada) e 5.420 ± 260 AP (não calibrada) (LÓPEZ MAZZ, 2001), no Brasil elas variam entre 845 ± 75 AP (não calibrada) e 2.980 ±30 AP, 3183 a 2967. A datação do Cerrito RS 167 A/7 revelou que o sítio foi ocupado à aproximadamente 2980 ± 30 AP (3183 a 2967), resultado obtido através do método C14 de uma amostra óssea enviada ao laboratório Beta Analytic. Destaca-se ainda que foram enviadas amostras de mais três sítios, no entanto, só esta foi passível de datação (DA ROSA, 2019). Dessa forma, das 35 datações identificadas para os cerritos no território brasileiro, até o presente momento o Cerrito RS 167 A/7 apresenta a datação mais recuada. Esse dado, até o ano de 2019 era referente então ao sítio Corredor do Bolso (GARCIA, 2019).

PERILLO FILHO, Átila & DA ROSA, Estefania Jaekel. Relatório de Avaliação de Impacto na Área do Implantação do Complexo Eólico Canelões, município de Santa Vitória do Palmar, RS. (2020)

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